O sol raiava pelas frestas nas portadas desbotadas, forçando a escuridão do quarto à realidade do nascer de um novo dia. As paredes brancas realçavam o castanho pardo dos móveis. Num contraste ameaçador o espaço convidava a penitência. Os cortinados de uma avelã cortês estirados sobre o dossel, pávidos e alquebrados. Os espelhos emoldurados reflectiam dourado, espelhando um corpo pesadamente adormecido, envolto em lençóis enrodilhados por nocturnas batalhas de consciência.

A vidraça da sua janela contava dez anos desde a partida do pai. O seu antigo quarto, recheado de cor e boas recordações, via a suas entranhas vendidas, cobertas de pó e saudade. Os passos dos criados, que subsistiram ao despedimento colectivo, ecoavam pela casa oca, numa melodia lenta e compassada. Tudo o que aquela casa havia sido perdera se com o tempo. Sobrava o quarto dos criados, a sala de estar e aquela penitenciaria onde descansava agora o corpo pesado de ânsia.

Não recebera uma única carta durante a sua ausência. Não se suspeitava se estaria vivo ou morto, se se perdera ou contava voltar. E os anos iam passando e o eco tornava se cada vez mais ensurdecedor. Cada vagueio dentro daquela casa era um martelar de dor sobre um espírito já de si tão melindrado. Sentia se abandonada, mas mantinha orgulhosamente a aparência de soberana. Coordenava as actividades da casa num frenesim de abelha, como se aguardasse desesperadamente o momento, o regresso de seu pai. O seu íntimo desesperava com os longos dias, e as noites intermináveis. Não saía da propriedade em qualquer circunstancia. Sabia que se algum dia ele regressasse seria ali que o encontraria, e no entanto ate agora não o havia feito.





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