18.02

"Numa tarde adormecida, a velha repousava junta à cascada janela ouvindo ao longe e ao de leve, a chuva violenta massacrar a vidraça. Abriu os olhos sem demora. Não tinha pressa de voltar a mirar a estação a que a sua vida tinha chegado. Custava-lhe olhar a sua casa, húmida, fria, desgastada, abandonada, … Uma solidão consistente.

Há muito que já não se via ao espelho baço do quarto de banho, mas quando passava o tacto pelo rosto, tremia, … Não era capaz de se reconhecer. Deixava-se esquecida na poltrona poeirenta horas a fio. Não se preocupava mais em arrastar aquele corpo pesado e enrodilhado, que se mostrava demasiado largo para lhe assentar devidamente no esqueleto saliente.

Mais um dia, um descartar de horas inúteis. No seu colo ainda se acomodava o álbum, que minutos antes folheara. A velhice e a vizinhança, só lhe concebiam breves momentos de sono por dia. Para além disso, vivia em sobressalto. Ao mínimo murmúrio, a sua mente despertava assombrada, paranóica. À noite a escuridão negava-lhe firmeza, sentia-se desconfortavelmente deserta. O silêncio acentuava a sua solidão. Nem o som da brisa parecia desejar acompanhá-la.

Haviam já três semanas que chovia frio e nevoeiro. A depressão consumia a paisagem. Desta vez tinha sido o bater da ramagem na porta que a tinha acordado. Arrastando-se para a cama, ainda sentia a adrenalina e o sobressalto a escorrer-lhe lentamente pelo corpo. Escorregava-lhe a vida pelo olhar vago, e deixou-se então embater perdida contra as elasticidades ferrugentas do colchão. O sono arrebatou-a, sem misericórdia, num sopro.(...)"



[Já encontrei um final ^^

Sem comentários: