31.03.10

Acrescento a este cantinho uma ilustração de Camilla Engman, que se relaciona com o sentido de "fragmentos".
Entretanto voltei a escrever.





Num quarto apertado de uma casa antiga, o sol teimava em aquecer as paredes húmidas.


Deitada sobre a cama, a senhora deixava o cabelo grisalho, curto, descansar sobre a almofada.
Há muito que perdera a capacidade de se mover. Mas a doença impedia que a realidade a assombrasse.

E enquanto a sua mente se perdia em memórias antigas, ia falando em tom baixo:


-Como é que eu estava nas Bodas? Ia bonita não ia? Já tinha o casaco preto. Aquele de pêlo, lembras-te? Quando fui à modista sabia que queria um vestido amarelo. Sempre gostei muito do amarelo.
Mandei fazer uma flor do mesmo tecido para colocar ao peito. Mas os sapatos tinham que ser diferentes. Não ia toda de amarelo, não é? - suspirou, como alguém que recorda uma tarefa por cumprir - Maria?

-Diga senhora.

-Tenho que sair. Vai-me buscar o casaco preto e os sapatos de verniz amarelo.

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